A revolução política
Portugal e o mundo lusófono passaram por momentos históricos e transformações sociais extremamente importantes na segunda metade da década de 1970 e na primeira metade da década de 1980.
O período foi definido pela Revolução dos Cravos de Abril de 1974, a qual trouxe o fim de um regime autoritário velho de quase 50 anos (desde o golpe de 1926 e posterior estabelecimento do Estado Novo salazarista em 1933), e o princípio de um processo de democratização, acompanhados do fim simultâneo da Guerra Colonial e subsequente independência dos territórios africanos em 1975.
O novo período foi inicialmente marcado por golpes falhados, tanto de direita como de esquerda, por uma forte polarização e por instabilidade política, seguindo uma divisão típica da Guerra Fria e característica do período, que opôs dois grandes grupos: aquele apostando em instalar um regime político e económico socialista e um outro favorecendo uma democracia liberal e capitalista ao estilo ocidental. Os governos iniciais viram-se progressivamente dominados pelas forças socialistas, levando a grandes mudanças sociais e económicas: direitos civis e laborais foram reforçados, sectores económicos cruciais passaram para o controlo directo do Estado, muitos bancos e outras empresas foram nacionalizados, fábricas foram ocupadas e vastas extensões de terra expropriadas para serem postas sob controlo dos trabalhadores agrícolas.
No entanto, em Novembro de 1975, os revolucionários de pendor liberal-democrático passaram a controlar o processo. Foram anunciadas eleições e uma nova Constituição foi aprovada em 1976, misturando princípios liberais-democráticos com princípios socialistas. A construção do Estado-Providência tornou-se obrigatória sob a nova Constituição e os princípios socio-económicos tonaram-se cada vez mais moderados.
Os choques económicos
O período foi também marcado por uma combinação de importantes choques económicos, tanto externos como internos. Os externos foram o fim do chamado “sistema de Bretton Woods” em 1971 (o sistema de câmbios fixos criado em 1945), depois da decisão da administração Nixon de terminar a convertibilidade em ouro do dólar dos EUA; e a decisão dos países árabes pertencentes à Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) em 1973 de embargar as exportações de petróleo para vários países ocidentais.
O choque interno foi a revolução de 1974 e as suas consequências. Para além das mudanças políticas acima mencionadas, a revolução conduziu a um processo de descolonização com enorme impacto no país: colonos em pânico começaram a fugir das colónias, em especial Moçambique e Angola, em direcção ao Portugal metropolitano, naquele que foi o maior movimento populacional de curto-prazo para dentro do país em toda a sua história. O crescimento da população e da oferta de trabalho, combinado com aumentos de salários e fuga de capitais, deram origem a uma crise económica de grande gravidade.
A partir de 1976, os governos do país necessitaram, por um lado, de lidar com a crise e, por outro, de desenvolver os serviços sociais associados ao Estado-Providência, os quais já o haviam feito nos outros países europeus muito antes, durante o período do pós-guerra. A despesa pública em Saúde, Educação e na Segurança Social aumentaram significativamente em relação ao período do regime salazarista, na segunda metade dos anos de 1970.
O crescimento dos défices orçamentais e da inflação, neste último caso causada sobretudo pelos preços dos bens importados no contexto da crise do petróleo, levaram contudo a problemas de dequilíbrio dos pagamentos internacionais. A situação da economia foi ainda mais agravada pela interrupção do comércio com as antigas províncias ultramarinas, devido à sua independência, e pela redução do turismo e das remessas de emigrantes, devido à turbulência política em Portugal, o que, tudo combinado, levou a uma longa crise de pagamentos internacionais. Três acordos de stand-by (ASB) com o Fundo Monetário Internacional (FMI) foram assinados em 1977, 1978 e 1983.
As intervenções do FMI
Os governos reponderam à balança de pagamentos negativa de duas maneiras: utilizando as reservas em divisas na posse do Banco de Portugal e obtendo empréstimos de países ocidentais e instituições internacionais. Dois programas de austeridade foram adoptados em 1977, as taxas de juro foram aumentadas, tectos ao crédito bancário foram introduzidos, os impostos foram aumentados e o investimento público reduzido. Um sistema de desvalorização cambial programada, a que se deu o nome “crawling peg”, foi introduzido em Setembro de 1977.
Um grande empréstimo foi então concedido a Portugal por um conjunto de países liderados pelos EUA, sob condição de que teria de ser acompanhado por assistência do FMI. Em resultado disso, Portugal assinou um novo ASB com o FMI em 1978, o qual agora impôs uma série de medidas de condicionalidade: foi introduzido um tecto ao crédito bancário a ser concedido às empresas públicas; o Governo adoptou uma política orçamental restritiva; e os preços dos bens que o Governo definia administrativamente foram aumentados. A depreciação sob o crawling peg foi reforçada. Estas medidas foram bastante eficazes para resolver o problema do desequilíbrio internacional, com a balança de transacções correntes a chegar ao equilíbrio em 1979.
Outro choque petrolífero em 1979, combinado com certas medidas expansionistas internas, inverteram esses passos positivos. Em 1983, um novo ASB foi assinado entre Portugal e o FMI. Desta vez, as medidas foram mais estritas, mesmo se essencialmente da mesma natureza do que sob os dois anteriores ASB. O programa foi outra vez bem sucedido no que toca ao reequilíbrio externo, mas teve um custo maior em termos de crescimento económico e desemprego. O reequilíbrio permitiu a Portugal tornar-se membro da União Europeia (UE), então designada Comunidade Económica Europeia (CEE), o que aconteceu em 1986, após longas negociações.
Ao longo de todo este período (1974-1985), o crescimento económico foi modesto e volátil, trazendo uma interrupção do processo de convergência do PIB per capita com os países da UE, que tinha sido muito rápido entre 1950 e 1973.
Portugal e o mundo lusófono passaram por momentos históricos e transformações sociais extremamente importantes na segunda metade da década de 1970 e na primeira metade da década de 1980.
O período foi definido pela Revolução dos Cravos de Abril de 1974, a qual trouxe o fim de um regime autoritário velho de quase 50 anos (desde o golpe de 1926 e posterior estabelecimento do Estado Novo salazarista em 1933), e o princípio de um processo de democratização, acompanhados do fim simultâneo da Guerra Colonial e subsequente independência dos territórios africanos em 1975.
O novo período foi inicialmente marcado por golpes falhados, tanto de direita como de esquerda, por uma forte polarização e por instabilidade política, seguindo uma divisão típica da Guerra Fria e característica do período, que opôs dois grandes grupos: aquele apostando em instalar um regime político e económico socialista e um outro favorecendo uma democracia liberal e capitalista ao estilo ocidental. Os governos iniciais viram-se progressivamente dominados pelas forças socialistas, levando a grandes mudanças sociais e económicas: direitos civis e laborais foram reforçados, sectores económicos cruciais passaram para o controlo directo do Estado, muitos bancos e outras empresas foram nacionalizados, fábricas foram ocupadas e vastas extensões de terra expropriadas para serem postas sob controlo dos trabalhadores agrícolas.
No entanto, em Novembro de 1975, os revolucionários de pendor liberal-democrático passaram a controlar o processo. Foram anunciadas eleições e uma nova Constituição foi aprovada em 1976, misturando princípios liberais-democráticos com princípios socialistas. A construção do Estado-Providência tornou-se obrigatória sob a nova Constituição e os princípios socio-económicos tonaram-se cada vez mais moderados.
Os choques económicos
O período foi também marcado por uma combinação de importantes choques económicos, tanto externos como internos. Os externos foram o fim do chamado “sistema de Bretton Woods” em 1971 (o sistema de câmbios fixos criado em 1945), depois da decisão da administração Nixon de terminar a convertibilidade em ouro do dólar dos EUA; e a decisão dos países árabes pertencentes à Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) em 1973 de embargar as exportações de petróleo para vários países ocidentais.
O choque interno foi a revolução de 1974 e as suas consequências. Para além das mudanças políticas acima mencionadas, a revolução conduziu a um processo de descolonização com enorme impacto no país: colonos em pânico começaram a fugir das colónias, em especial Moçambique e Angola, em direcção ao Portugal metropolitano, naquele que foi o maior movimento populacional de curto-prazo para dentro do país em toda a sua história. O crescimento da população e da oferta de trabalho, combinado com aumentos de salários e fuga de capitais, deram origem a uma crise económica de grande gravidade.
A partir de 1976, os governos do país necessitaram, por um lado, de lidar com a crise e, por outro, de desenvolver os serviços sociais associados ao Estado-Providência, os quais já o haviam feito nos outros países europeus muito antes, durante o período do pós-guerra. A despesa pública em Saúde, Educação e na Segurança Social aumentaram significativamente em relação ao período do regime salazarista, na segunda metade dos anos de 1970.
O crescimento dos défices orçamentais e da inflação, neste último caso causada sobretudo pelos preços dos bens importados no contexto da crise do petróleo, levaram contudo a problemas de dequilíbrio dos pagamentos internacionais. A situação da economia foi ainda mais agravada pela interrupção do comércio com as antigas províncias ultramarinas, devido à sua independência, e pela redução do turismo e das remessas de emigrantes, devido à turbulência política em Portugal, o que, tudo combinado, levou a uma longa crise de pagamentos internacionais. Três acordos de stand-by (ASB) com o Fundo Monetário Internacional (FMI) foram assinados em 1977, 1978 e 1983.
As intervenções do FMI
Os governos reponderam à balança de pagamentos negativa de duas maneiras: utilizando as reservas em divisas na posse do Banco de Portugal e obtendo empréstimos de países ocidentais e instituições internacionais. Dois programas de austeridade foram adoptados em 1977, as taxas de juro foram aumentadas, tectos ao crédito bancário foram introduzidos, os impostos foram aumentados e o investimento público reduzido. Um sistema de desvalorização cambial programada, a que se deu o nome “crawling peg”, foi introduzido em Setembro de 1977.
Um grande empréstimo foi então concedido a Portugal por um conjunto de países liderados pelos EUA, sob condição de que teria de ser acompanhado por assistência do FMI. Em resultado disso, Portugal assinou um novo ASB com o FMI em 1978, o qual agora impôs uma série de medidas de condicionalidade: foi introduzido um tecto ao crédito bancário a ser concedido às empresas públicas; o Governo adoptou uma política orçamental restritiva; e os preços dos bens que o Governo definia administrativamente foram aumentados. A depreciação sob o crawling peg foi reforçada. Estas medidas foram bastante eficazes para resolver o problema do desequilíbrio internacional, com a balança de transacções correntes a chegar ao equilíbrio em 1979.
Outro choque petrolífero em 1979, combinado com certas medidas expansionistas internas, inverteram esses passos positivos. Em 1983, um novo ASB foi assinado entre Portugal e o FMI. Desta vez, as medidas foram mais estritas, mesmo se essencialmente da mesma natureza do que sob os dois anteriores ASB. O programa foi outra vez bem sucedido no que toca ao reequilíbrio externo, mas teve um custo maior em termos de crescimento económico e desemprego. O reequilíbrio permitiu a Portugal tornar-se membro da União Europeia (UE), então designada Comunidade Económica Europeia (CEE), o que aconteceu em 1986, após longas negociações.
Ao longo de todo este período (1974-1985), o crescimento económico foi modesto e volátil, trazendo uma interrupção do processo de convergência do PIB per capita com os países da UE, que tinha sido muito rápido entre 1950 e 1973.